Qual a função das células-tronco?

função das células-troncoAs células-tronco são aquelas que têm a capacidade de se dividir através da mitose, de forma assimétrica, resultando em células que podem se diferenciar de uma célula específica em alguma etapa do desenvolvimento, e em células-filhas com suas mesmas características (autorrenovação). Este conceito é objeto de debate, pois algumas das células consideradas como tronco não possuem capacidade de renovação durante a vida e, além disso, a capacidade de diferenciação de outros células específicas também é diferente.

É bastante comum que as células-tronco se classifiquem de acordo com a capacidade de diferenciação que tenham, também conhecida por potência. As células-tronco que podem se diferenciar em qualquer tipo de tecido são conhecidas como totipotentes e pluripotentes. Entre as totipotentes está o zigoto e as células que formam a mórula, e se dividem em células extraembrionárias e células embrionárias, que têm a capacidade de formar um organismo completo. As pluripotentes, por sua vez, se originam das totipotentes e podem ser diferenciadas em qualquer tipo de células, mas não podem chegar a formar um organismo em sua totalidade. Neste grupo se encontram as células-tronco embrionárias, que são as que formam parte do blastócito.

Tipos de células que são incluídas no conceito de células-tronco

Existem outros tipos de células que normalmente são incluídas no conceito de células-tronco. São elas as multipotentes e a onipotentes:

Células multipotentes

As células multipotentes são as que podem se diferenciar de qualquer dos tecidos pertencentes à sua linhagem embrionária.

Células onipotentes

Como células onipotentes são conhecidas aquelas células que podem se diferenciar em um único tipo de tecido.

Em outros casos, as células-tronco se agrupam de acordo com a etapa de desenvolvimento de um organismo em que se encontram. Por isso, as células-tronco embrionárias são as que se pode isolar de um embrião em seus primeiros estágios de formação, que é chamado blastócito; as fetais, como seu nome indica, serão as que podem isolar-se a partir de fetos e as adultas são as que podemos encontrar nos organismos já adultos.

Dentro destes grupos também podemos encontrar outras classificações como as células-tronco embrionárias germinativas e de carcinomas, por exemplo. Cada um dos grupos em que as células-tronco estão classificadas depende da funcionalidade das mesmas e da capacidade de proliferação que apresentam.

Células-tronco com pluripotencialidade induzida

Células-tronco com pluripotencialidade induzidaA fim de tentar elucidar os diferentes aspectos da potencialidade celular e dos mecanismos de plasticidade, foram desenvolvidas técnicas de reprogramação, mediante as quais as células unipotentes adquirem pluripotencialidade. A partir de células somáticas diferenciadas pertencentes a diferentes linhagens podem-se obter células pluripotentes. As células obtidas por estas técnicas de reprogramação são chamadas de células-tronco com pluripotencialidade induzida (iPSC). Os estudos desenvolvidos com este tipo de células têm grande importância no tratamento e diagnóstico de diversas doenças. Graças a eles, tem-se avançado nas diferentes terapias celulares e genéticas. Estas células têm características muito similares às das pluripotentes, que podem ser obtidas do blastócito, porém se diferenciam ao manter características epigenéticas das células originais.

A principal desvantagem do uso das iPSC é a sua tendência à formação de tumores, já que as mutações acumuladas nas células de origem se mantêm uma vez que tenham alcançado a pluripotencialidade, porém é indubitável que sua utilização abre uma perspectiva bastante ampla, enquanto se resolve um problema ético. Muitos pesquisadores discutiam o fato de se usar células embrionárias, porque existe a possibilidade de clonação. Sem dúvida, estas células possuem a pluripotencialidade das embrionárias, porém podem ser extraídas de qualquer tecido adulto, evitando o uso de embriões, sobretudo os humanos, que são os que geram mais controvérsias.

O outro problema que existia com as células-tronco com pluripotência induzida era que para sua obtenção eram utilizados agentes virais, por isso seu uso clínico não era viável. Porém, este inconveniente foi resolvido com o uso de proteínas recombinantes ou outros métodos que não impliquem no uso de genes virais que possam contaminar a cultura final.

No campo da investigação das doenças neurológicas, as células iPSC abriram a possibilidade de se utilizar técnicas de reprogramação para tratar estas doenças. Atualmente, se pode observar o comportamento de células vivas de pacientes que sofrem de doenças neurodegenerativas e, apesar da grande variedade que existe, terapias específicas para cada fenótipo podem ser desenvolvidas. Recentemente, foi comprovado que as células-tronco têm a mesma variação no número de cópias das que se encontram diferenciadas no organismo. Sem dúvida, a variação genética destas células é menor do que as que deram origem, de onde se pode concluir que a variação dos neurônios ocorre em etapas mais avançadas de diferenciação, considerando o que isso implica no desenvolvimento de doenças neurológicas.

O descobrimento das células-tronco com pluripotencialidade induzida, apesar de ser algo recente, deu uma guinada nas pesquisas relacionadas com as células-tronco. A cada dia aparecem mais produtos no mercado para satisfazer a demanda que gera esse tipo de pesquisa. Um exemplo disso são as enzimas histonas deacetilases. As histonas diacetilases (HDAC) têm um papel muito importante na formação da estrutura da cromatina, que são as proteínas que envolvem o DNA genômico. A transcrição do DNA genômico está regulada por diferentes transcritores, e entre eles se encontram as histonas acetiltransferases, que promovem a transferência de um grupo acetila da acetil coenzima A aos grupos aminos da lisina localizada na posição épsilon. As HDAC revertem a ação das histonas acetiltransferases, inibindo a transcrição do DNA. A inibição da transcrição do DNA genômico permite manter as células-tronco embrionárias ou com pluripotencialidade induzida em um estado não diferenciado.

Para evitar a proliferação das células-tronco em culturas utilizadas nas pesquisas, a Wako comercializa diferentes produtos que agem como inibidores de histona deacitelase e em alguns casos como ativadores de SIRT1. Alguns destes produtos e de suas funções são apresentados a seguir:

M344 Inhibidor de HDAC Clase I y II. Homólogo estructural de Tricostatin
ITSA1 Inhibidor de Tricostatin A
MC 1293 Inhibidor de HDAC1 y desacetilasa de maíz
MS-275 Inhibe a HDAC1 y HDAC3 pero no afecta a HDAC8
Piceatannol Activador de HDAC Clase III (SIRT1) / Inhibidor de la proteína tirosina kinasa syk
Buteína Activador de HDAC Clase III (SIRT1) / Inhibidor de la proteína tirosina kinasa syk
Resveratrol Activador de HDAC Clase III (SIRT1) / Inhibidor de Cox-1
Sirtinol Inhibidor de HDAC Clase III. Permeable
Splitomicina Inhibidor de HDAC Clase III. Permeable
Acido valproico Aumenta la eficiencia en la inducción de células pluripotentes por Oct4
Tricostatin A Inhibidor potente y reversible de HDAC Clase I y II

Durante anos, os cientistas vem tentando controlar as respostas imunes indesejadas do organismo através da manipulação dos mecanismos regulatórios endógenos. Recentemente, tem-se vislumbrado a possibilidade da regulação da transcrição dos genes por inibição da histona deacetilase. Além disso, as possibilidades terapêuticas que o uso dos inibidores da histona deacetilase abre são inúmeros, já que além de desacetilar os resíduos de lisinas terminais de histonas, também catalisam a desacetilação de outras proteínas que não sejam histonas. Entre as proteínas sobre as quais as histonas deacetilases agem, encontra-se o fator de transcrição FOXP3, que desempenha um papel muito importante no desenvolvimento e regulação das células T.

Uso de células-tronco no tratamento de doença

Muitas doenças que afetam os seres humanos acontecem por problemas de regeneração de tecidos que, em teoria, podem ser tratadas com células-tronco. Ao isolar culturas de células-tronco abriram-se grandes possibilidades para se utilizar estas células na regeneração de tecidos com finalidades terapêuticas. As células-tronco hematopoiéticas foram as primeiras que se identificaram como úteis para esta finalidade. Logo se descobriu que a partir de uma única célula-tronco mesenquimal também podem ser formados ossos, cartilagens e outros tecidos mesenquimais. Estas células, ao serem clonadas, diferenciam-se em vários tipos de linhagens que incluem osteoblastos, condrócitos e adipócitos. Também pode ser diferenciadas como precursoras de neurônios, células musculares e de outros tipos. Atualmente, foram feitos testes clínicos em humanos, fazendo uso de células-tronco, para o tratamento de doenças muito diversas, como:

  • Doenças sanguíneas e do sistema linfático (principalmente leucemia e também se tem tratado alguns tipos de anemias, problemas de coagulação sanguínea, linfoma no-Hodgkin).
  • Doenças causadas por bactérias e fungos (micoses, doenças de transmissão sexual, infecções por bactérias Gram-positivas).
  • Transtornos mentais e de comportamento (demência, agressividade, Alzheimer).
  • Diversos tipos de câncer e outras neoplasias.
  • Doenças do sistema digestório.
  • Doenças e anomalias apresentadas antes e durante o nascimento.
  • Doenças do sistema imune (doença de Hodgkin, distúrbios imunoproliferativos, linfoma de Burkitt).
  • Doenças que afetam os músculos, ossos e cartilagens (osteoartrite, reumatismo).
  • Infecções do trato urinário e dos órgãos genitais.
  • Doenças virais, especialmente em terapias contra o HIV.
  • Feridas e traumatismos.

Pode-se dizer que a terapia com as células-tronco ainda está no início, apesar de que já são relatados muitos casos de curas e testes clínicos satisfatórios, onde se prevê que será muito mais comum o uso deste tipo de terapia. Entre as técnicas desenvolvidas atualmente está a terapia regenerativa (também chamada celular ou engenharia de tecidos), onde se substituem células danificadas; o transplante de progenitores hematopoiéticos; a terapia genética (neste caso se substitui um gene defeituoso ou ausente que causa uma doença) e as terapias modificadoras da resposta biológica ou imunoterapias.

Em geral, se pode dizer que todas estas terapias se baseiam na indução de fatores de crescimento e de fenômenos anti-inflamatórios e autoimunes por parte das células-tronco.

Para se utilizar as células-tronco em diferentes terapias, devem-se levar vários fatores em conta. A seleção das células-tronco que serão utilizadas nas terapias é muito importante ao considerar relatos de que diferentes linhas celulares são potencialmente teratogênicas. Além disso, deve-se considerar que a quantidade de células utilizadas nas terapias pode afetar o sucesso das mesmas e que no processo de proliferação a informação genética se mantenha estável.

Para fazer a cultura das células-tronco que serão utilizadas na terapia é necessário que o meio de cultura esteja livre de componentes animais. A composição do meio de cultura é chave para o desenvolvimento das culturas e para sua conservação posterior. O soro mais comumente utilizado é o soro fetal bovino, composto por substâncias como hormônios, fatores de crescimento e vitaminas, por exemplo, em concentrações desconhecidas, o que pode acarretar problemas de reprodutibilidade dos ensaios e de contaminação das culturas por vírus ou agentes infecciosos bovinos. Considerando-se tudo isto, e também o fato de que as proteínas de origem animal podem causar alergias nos seres humanos, se faz necessário a utilização de novos meios de cultura, livres do soro. Entre elas podemos destacar o meio de congelamento BAMBANKER™, que se pode utilizar, tanto para as células iPSC, como tumorais e de outros tipos. Este meio não contém soro e evita a utilização de nitrogênio liquido para conservar as culturas celulares. Com o uso deste meio da Wako os fabricantes de reagentes de laboratório, pode-se criopreservar as culturas durante grandes períodos, a -80ºC.

Sistema imunológico e células-tronco

Sistema imunológico e células-troncoAs terapias que envolvem transplante de órgãos ou de medula óssea no tratamento podem provocar o aparecimento da doença conhecida como enxerto-contra-hospedeiro (EICH), que afeta principalmente a pele, o trato gastrointestinal e o fígado. Esta doença é provocada pela reação que se produz quando o sistema imunológico do doador começa a agir no indivíduo que recebe o transplante, através das células tronco. É por isso que depois de alguns transplantes de células-tronco indica-se um tratamento com imunossupressores. O tratamento do EICH leva com que o paciente possa ser atacado por alguns patógenos, ao ter seu sistema imunodeprimido, como é o caso do citomegalovírus.

As células mesenquimatosas apresentam níveis intermediários de antígenos leucocitários humanos (HLA, na sigla em inglês), o complexo principal de histocompatibilidade do enxerto-contra-hospedeiro de classe I, e podem induzir a expressão de outros tipos de antígenos. Sem dúvida, não induzem a expressão de moléculas coestimulatórias e não ativam as células T aloreativas. De fato, se comprovou que suprimem a proliferação de células T, mediando à imunosupressão. Esta propriedade é muito importante em pesquisas relacionadas com transplantes de órgãos. Estudando mais a fundo a relação entre as células mesenquimatosas e a resposta imune se observou que elas alteram a secreção de citocina, aumentam a proporção das células T regulatórias e inibem a secreção de interferon pelas células NK (natural killer, ou células assassinas).

Por outro lado, conseguiu obter-se células NK a partir de células-tronco embrionárias e de células-tronco embrionárias induzidas. As células NK estão sendo estudadas em terapias contra o HIV e têm um papel muito importante na luta contra o câncer e contra infecções virais. Desenvolveram-se muitas pesquisas nos últimos anos para compreender os mecanismos pelos quais as células NK atuam, relacionados com a terapia genética e com as doenças mencionadas anteriormente. Para conduzir estes estudos, a companhia WAKO comercializa o anti-soro de coelho contra Asialo GM1. Este anti-soro elimina a atividade das células NK, tanto in vitro como in vivo. Este anticorpo policlonal de coelho reage com os anticorpos anti-ganglioside asialo- GM1.

Perspectivas futuras para o uso das células-tronco

Recentemente, a revista científica Cell Stem Cell publicou um número com artigos sobre as possibilidades futuras da utilização das células-tronco. Um dos usos em potencial das células-tronco é a modelagem de doenças humanas para compreender a base molecular dos processos. As terapias desenvolvidas, uma vez que se modelem as doenças, poderão ser mais exatas, com menos efeitos colaterais e poderão curar uma porcentagem maior de doentes, em comparação com as que existem atualmente. Além disso, estes modelos servirão para definir os genes envolvidos, estabelecer alvos terapêuticos mais precisos e desenvolver medicamentos mais eficientes.

Depois dos avanços nas pesquisas sobre a diferenciação celular e a regeneração dos tecidos, futuramente se pretende conseguir a organogênese a partir de culturas de células-tronco em 3D. Para a diferenciação celular na fase embrionária existem sinais que provêm do que se poderiam chamar regiões organizadoras, e não basta conhecer como funcionam para saber como um órgão complexo como o cérebro dos mamíferos é formado. Por outro lado, ao observar o comportamento dos teratomas e das células pluripotentes que foram introduzidas em um blastócito tetraplóide e formam o embrião de rato, se pode afirmar que as células-tronco pluripotentes têm a capacidade de gerar estruturas de tecidos com certo grau de organização espontaneamente. O crescimento organizado das células-tronco até formar estruturas complexas pode ser compreendido como um comportamento social, onde a manipulação de comportamento coletivo pode disponibilizar à medicina regenerativa ferramentas para a simulação de situações reais.

A cultura de células-tronco em 3D também pode ser usada para fins sintéticos e em longo-prazo modular as interações entre os genes durante o crescimento celular e atingir estruturas complexas a partir de condições iniciais pré-determinadas. Todos esses estudos possibilitaram a formação de novos tecidos mais funcionais que os tecidos humanos usados nos transplantes. Pretende-se que as células-tronco sirvam para desenvolver a medicina regenerativa a partir do controle espaço-temporal das interações celulares dinâmicas.

Um passo significativo em relação às células-tronco de pluripotência induzida é que estas podem ser obtidas também in vivo. Já se demonstrou que a pluripotencialidade pode ser induzida em ratos vivos que tenham sido manipulados geneticamente. Nestas pesquisas se observou que as células iPSC obtidas in vivo chegam a ter as características da totipotentes, ou seja, podem substituir todos os tipos de células. Este é um dos exemplos que demonstra que o futuro das pesquisas com células-tronco é muito promissor e que bons resultados continuarão a ser obtidos para a cura de doenças, assim como a compreensão dos mecanismos através dos quais a vida opera.

Existem outros usos potenciais das células-tronco, como o preparo de comida a partir de carne obtida em um laboratório, que já teve sua eficiência comprovada por cientistas holandeses que criaram um hambúrguer a partir de células-tronco extraídas de uma vaca e que preveem que, por questões do meio ambiente e ética, poderá ser o alimento do futuro. Obviamente que ainda teriam que se reduzir os custos do processo e conseguir que se possa chegar a uma produção industrial. Também se tem conseguido obter ossos utilizando lâminas de carbono que sustentam as células e promovem o crescimento de tecido ósseo nos ossos, processo pelo qual a medicina regenerativa considera que irá se estender a todos os tipos de tecido do corpo humano.

Um dos avanços a destacar utilizando as células-tronco com pluripotência induzida é a obtenção de um ovário a partir de óvulos em laboratório. Além de se obter óvulos e espermatozoides em ratos que são submetidos a tratamentos com células-tronco, sabe-se que o mesmo ocorre em humanos, resultados que trazem uma grande esperança para pessoas com problemas de fertilidade e também um debate ético que continua mudando de rumos, à medida que as descobertas avançam. Na realidade, ainda há um longo caminho a ser percorrido, pois se deseja conseguir uma forma de obter células adultas de qualquer pessoa que consigam curar as suas doenças, sem os problemas que as células externas apresentam com a compatibilidade, pelos distúrbios imunológicos que podem causar. 

PRODUTOS UTILIZADOS EM PESQUISAS COM CÉLULAS TRONCO

Inibidores de histona deacetilase Anti-soro contra asialo GM1 Ativador de SIRT1
Inibidores de histona deacetilase Anti-soro contra asialo GM1 Ativador de SIRT1